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terça-feira, janeiro 14, 2025

Novos estudos: auxílio do governo diminui emprego e renda salarial 

Os defensores dos programas de renda básica costumam rejeitar a afirmação de que esses pagamentos incondicionais (sem contrapartida) desestimulam a busca das pessoas de baixa renda por trabalho. 

Mas novas pesquisas mostram uma realidade diferente. 

Dois estudos publicados recentemente avaliaram programas de renda básica — um nos Estados Unidos e um no Brasil — e chegaram a conclusões semelhantes: embora tragam alguns resultados positivos, esses pagamentos incondicionais levaram a uma redução no valor da renda salarial. 

Ambos os artigos foram publicados por um centro de estudos tradicional dos Estados Unidos: o Escritório Nacional de Pesquisa Econômica (NBRE, na sigla em inglês). 

Experimento em larga escala na Califórnia 

Entre 2021 e 2023, a cidade de Compton, na Califórnia, manteve um programa de renda básica. Na verdade, a iniciativa era um experimento produzido com o objetivo de medir os efeitos de programas desse tipo. O estudo foi mantido com recursos de doadores. 

Dentre as famílias de baixa renda da cidade, 695 passaram a receber um pagamento mensal de aproximadamente US$500. Outras 1.042 famílias foram colocadas no grupo de controle (ou seja: não receberam os recursos mas também passaram a ter os hábitos monitorados). Não havia contrapartidas para participar do programa. 

A seleção das famílias foi feita de forma aleatória, o que cria o cenário ideal para os economistas. A única diferença entre os dois grupos era o auxílio mensal.  

Após 18 meses, os pesquisadores mediram o resultado do experimento. No grupo incluído no programa de renda mínima, o nível de emprego caiu e a renda familiar (descontado o benefício) baixou. 

Os resultados foram publicados em um artigo em dezembro do ano passado. O estudo é assinado por um grupo de cinco autores, entre eles uma pesquisadora da Universidade de Stanford e dois da Universidade de Nova York. 

Menos renda e menos emprego 

O estudo feito na Califórnia mostrou que, no grupo beneficiado pelo programa social, a renda mensal das famílias caiu, em média, US$ 333 (excluindo o valor do benefício). Os gastos também diminuíram — em média, US$ 302.  

A redução na renda provavelmente está associada a outra consequência dos pagamentos incondicionais: embora o nível de emprego das pessoas que tinham trabalho em tempo integral tenha continuado o mesmo, o índice de emprego dos que trabalhavam 20 horas ou menos por semana caiu 13%.

A descoberta indica que muitos participantes do programa reduziram a carga de trabalho quando passaram a receber recursos estatais.

Consumo de cigarro aumentou 

O levantamento também encontrou uma mudança curiosa entre os beneficiários do programa de renda básica. Ao mesmo tempo em que informaram estar gastando menos em cigarros, eles na verdade estavam consumindo mais cigarros que as pessoas de baixa renda não incluídas na iniciativa. 

Os autores conseguiram identificar esse efeito escondido por meio de um experimento engenhoso: eles dividiram os participantes em dois grupos e apresentaram uma lista de itens corriqueiros. Em vez de perguntarem diretamente quais daqueles itens a pessoa tinha praticado recentemente, eles pediram apenas que as pessoas apenas indicassem quantos itens da lista elas haviam praticado.  

A lista era idêntica para os dois grupos, com uma exceção: o item que tratava do cigarro. Com isso, foi possível estimar o percentual de participantes que havia fumado recentemente. 

Os pontos positivos 

No programa de renda básica de Compton, os pagamentos incondicionais também resultaram em alguns benefícios. Um deles foi a redução na violência doméstica  

Os autores também encontraram indícios de que o endividamento caiu, embora o valor não seja estatisticamente significativo. Já o bem-estar psicológico e financeiro não melhorou. 

Ao fim, os autores afirmam que é preciso ter uma visão “com nuances” de iniciativas de renda básica. “Os impactos negativos nos rendimentos auferidos e nas despesas devem ser vistos no contexto mais amplo de outros impactos, especialmente a sugestiva (mas não significativa) diminuição da dívida”, eles escrevem.  

Resultado parecido em pesquisa feita no Brasil 

Uma das autoras do estudo sobre Compton, a economista Sidhya Balakrishnan, também assina outro artigo recente, publicado em outubro do ano passado, e que tem como objeto um programa de transferência de renda mantido pela prefeitura de Maricá (RJ). 

O Renda Básica de Cidadania (RBC) promete pagamentos mensais às famílias de baixa renda da cidade. Assim como em Compton, não havia contrapartida. Assim como em Compton, a renda salarial dos participantes caiu — neste caso, em 17%.  

Os autores observam que a redução no nível de emprego e na quantidade de horas trabalhadas foi menor que a queda nos rendimentos. Uma possível explicação é a hipótese de que os beneficiados mudaram de emprego para vagas lhes agradavam mais, mas que pagavam menos. 

No caso de Maricá, os pesquisadores também foram surpreendidos com uma queda no nível de segurança econômica entre os participantes do programa. “Este achado inesperado é impulsionado por uma redução no comportamento de poupança (por exemplo, poupar dinheiro no final do mês) entre as famílias do RBC”, afirma o artigo. 

Para os pesquisadores, a explicação tem a ver com o fato de que o benefício é pago em uma espécie de moeda alternativa, a Mumbuca, que só pode ser gasta na cidade e não serve para quitar empréstimos no sistema bancário formal, por exemplo. 

Talvez por isso, as pessoas incluídas no programa declararam um nível de segurança econômica menor que os não-participantes — o que, segundo os pesquisadores, tem a ver com “uma propensão menor a poupar e a um número maior de faturas de cartão de crédito não-pagas”. 

Outra conclusão que os autores chamam de “intrigante” é a de que, de repente, as famílias cadastradas no RBC ficaram maiores. A mudança provavelmente tem a ver com o fato de que o benefício leva em conta a renda familiar per capita. 

O programa de Maricá, que foi criado por uma gestão do PT 2013 e modificado várias vezes desde então, continua em vigor. O valor mensal pago pela prefeitura é de R$ 200 por pessoa, e 42,5 mil moradores da cidade são beneficiados. 

noticia por : Gazeta do Povo

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