Não era como se a situação já estivesse favorável, mas agora a crise foi exposta ao vivo e em cores em rede nacional na Colômbia. O país amanheceu nesta quarta-feira (5) somando renúncias no gabinete de Gustavo Petro, que implodiu após uma reunião da equipe que o próprio presidente ordenou que fosse transmitida para a população.
Durante o encontro, Petro criticou seus ministros nominalmente e também foi criticado. O ponto mais sensível foi observado na recente nomeação que fez de um político acusado de corrupção e violência contra a ex-esposa para ser seu chefe de gabinete.
A insatisfação e as acusações de que não há coesão no governo levaram às renúncias de ao menos três membros de menor expressão e a uma proposta no mínimo curiosa do ministro do Interior: que todos renunciem para permitir que Petro nomeie um novo gabinete.
Isso tudo em um momento no qual a Colômbia já se vê imersa em uma das maiores crises humanitárias das últimas décadas. O conflito entre guerrilhas na grande região cocaleira de Catatumbo, na fronteira com a Venezuela, já deixou ao menos 80 mortos e fez mais de 77 mil pessoas terem de fugir, abandonando suas terras e casas.
Não bastasse, há ainda a crise com os Estados Unidos. Não apenas pela escalada retórica envolvendo os imigrantes deportados por Donald Trump, mas pelo financiamento americano. Petro parece não querer admitir e desdenha da verba, mas as ações de Trump de congelar a ajuda externa impactam em cheio o país da América do Sul.
Além de receber dinheiro do Departamento de Estado americano para a área de segurança, a Colômbia é também o país da América Latina e do Caribe que mais fundos recebia da Usaid, a agência dos EUA para desenvolvimento internacional que está na mira de Trump, do chefe de sua diplomacia, Marco Rubio, e do bilionário Elon Musk, agora integrante do governo
A agência despeja mais de US$ 400 milhões anuais, em média, para Bogotá. É uma verba que apoia o terceiro setor, mas também o governo. Programas voltados para imigrantes (venezuelanos são 5% da população colombiana) e organizados pelo próprio governo foram paralisados agora que a agência está em moratória por três meses.
Todas essas crises em cascata a pouco mais de um mês das eleições presidenciais na Colômbia expuseram fragilidades no governo do primeiro presidente de esquerda do país. E, como diz a analista política Zulma González, a reunião ao vivo desta terça-feira (4) pode ter até virado sátira, mas de fato foi “a gota d’água para tudo transbordar”.
Ela diz que a “descoordenação do gabinete de Petro” foi, desde o início, “um ponto fraco desse governo”. “E agora pode haver um terremoto ministerial: que Petro peça a renúncia de todos os seus ministros.”
A reunião foi marcada por trocas de farpas, acusações e até lágrimas. O presidente disse ter sido inspirado por Cuba para transmitir ao vivo a conversa entre seus ministros. A diferença é que na ditadura de partido único da ilha caribenha a dissidência não é propriamente bem-vinda ou possível, diferente do que ocorre em democracias.
Ministras mulheres foram enfáticas ao criticar o chefe por nomear Armando Benedetti como seu chefe de gabinete. O controverso político foi seu chefe de campanha em 2022.
Esse ex-senador e ex-embaixador de Petro na Venezuela (um dos cargos mais sensíveis da diplomacia colombiana) é investigado por financiamento ilegal de campanha na corrida de Petro pela Presidência e foi acusado de ter ameaçado a agora ex-esposa com uma faca, uma afirmação que depois ela retirou.
A mais enfática foi a ministra Susana Muhamad (Ambiente). Com os olhos visivelmente cheios de lágrimas, disse que “como feminista e como mulher”, não poderia se sentar na mesa de gabinete de um projeto progressista com Armando Benedetti”. Disse que não renunciaria e pediu que Petro repensasse suas ações.
A vice-presidente e ministra da Igualdade, Francia Márquez, a primeira mulher negra a chegar ao posto, fez coro e disse se sentir desrespeitada pela nova chanceler nomeada por Petro, Laura Sarabia. Braço direito do presidente, Sarabia assumiu há poucos dias. Desde o início da gestão aponta-se que Francia tem sido escanteada na administração.
Até o momento, renunciaram Juan Correa, ministro da Cultura; Jorge Rojas, chefe do departamento de administração da Presidência; além de Carlos Carrillo, chefe do departamento de resposta a desastres. Espera-se que mais nomes se somem.
noticia por : UOL