sexta-feira, 6, junho , 2025 05:59

Castro apadrinhou em disputa no TJ ex-assessor de Brazão acusado de invadir terra em área de milícia

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), apadrinhou na disputa para uma vaga de desembargador no Tribunal de Justiça um advogado que foi assessor de Domingos Brazão —preso sob a acusação de envolvimento no assassinato de Marielle Franco— e é acusado de invadir terra pública em área de influência de milicianos na zona oeste da capital.

Antônio Carlos da Conceição Santos, conhecido como Pipo, estreitou nos últimos anos relação com Castro, para quem já cedeu sua casa em condomínio de luxo em Angra dos Reis para celebrar o aniversário.

Pipo integrou a lista sêxtupla da OAB no fim do ano passado para concorrer a uma vaga como desembargador. Contudo, apenas 29 dos 142 membros do TJ-RJ o incluíram na lista tríplice, ficando em último lugar, apesar de ter sido apadrinhado por Castro junto aos magistrados.

O advogado tinha pouca expressão no meio jurídico do Rio de Janeiro até entrar na lista da OAB. No TJ-RJ, seu nome tem evidência como parte de ações cíveis.

Em uma delas, Pipo é acusado pela Prefeitura do Rio de Janeiro de ter ocupado irregularmente na década de 1990 uma área pública às margens do Terreirão, favela no Recreio dos Bandeirantes (zona oeste). O município afirma que o advogado alugou lojas para comerciantes na região.

Por anos, a área sofreu com atuação de milicianos. Atualmente, o Comando Vermelho usa a região para atividades criminosas.

Pipo disse que foi identificado de forma errada pelo município como posseiro da área pública. No processo, ele declarou ser o proprietário de um lote vizinho, sem relação com o terreno em disputa.

O advogado afirmou conhecer Castro há mais de dez anos, quando ele “era apenas um cantor de igrejas católicas”. Declarou ter desenvolvido “um carinho familiar” pelo governador.

Pipo disse também que sua candidatura a desembargador foi fruto “de décadas de atuação na advocacia privada”. Ele negou ter sido apadrinhado por Castro, mas disse que sua proximidade com o governador lhe prejudicou.

“Sinto que o fato de ser amigo, irmão de fé, do Cláudio me prejudicou na disputa com os meus pares, o que se comprova pela baixa adesão que obtive entre os desembargadores na votação realizada”, declarou.

Procurado, o governador não comentou a relação com o advogado.

Em 2015, Pipo foi nomeado na Assembleia Legislativa como assessor de Brazão. O advogado assumiu no mesmo ano um cargo na Diretoria de Informática do TCE (Tribunal de Contas do Estado) assim que o ex-deputado foi eleito conselheiro da corte. O advogado deixou o cargo em abril de 2017, duas semanas depois da prisão de Brazão na Operação Quinto do Ouro, que apontou corrupção no tribunal.

O grupo político do conselheiro tem base eleitoral na zona oeste. De acordo com a Polícia Federal, ele fazia grilagem de terras na região por meio de laranjas. A atuação de Marielle Franco (PSOL) no tema teria sido, segundo a investigação, um dos motivos para que o ex-deputado tivesse encomendado seu assassinato. Ele nega.

Quando foi acusado de invadir uma área do município, Pipo tinha menos de 20 anos. Quem o defendeu na Justiça neste caso foi seu pai, o português Carmindo da Conceição Santos, advogado que também tem disputas imobiliárias na região do Terreirão.

Carmindo foi baleado em 2009 e atribuiu o atentado a um delegado com quem disputava a propriedade de um terreno na região. O português, porém, também foi acusado de coagir pessoas que poderiam testemunhar no processo envolvendo a posse da área. Ele chegou a ser condenado em primeira instância, mas acabou absolvido pela suposta coação no curso de processo. O crime de ameaça foi considerado prescrito.

Na Justiça, o pai de Pipo também acumula ações judiciais na qual cobra o pagamento de notas promissórias. O valor das ações supera R$ 4 milhões em alegados empréstimos.

Os alvos de Carmindo apontam em alguns casos fraude, falsificação em assinaturas e descrevem ameaças do credor envolvendo a participação de filhos —em um dos processos, ele é chamado de agiota. Ele nega.

Os imbróglios fundiários da família de Pipo não remontam apenas a anos distantes. O irmão do advogado, Bruno da Conceição Santos, teve o nome citado numa investigação sobre tentativa de grilagem de um terreno no Recreio dos Bandeirantes em 2023.

Um grupo registrou na Junta Comercial documentos falsos transferindo a propriedade de uma empresa para dois homens que não tinham relação com a firma. Posteriormente, os suspeitos repassaram a propriedade de dois lotes dela, avaliados em R$ 3,5 milhões, para Bruno, a fim de abater uma dívida.

Três pessoas foram denunciadas por estelionato. Bruno afirmou que não sabia da fraude e não foi indiciado. Contudo, a polícia indicou que o irmão de Pipo é citado em outros dois inquéritos semelhantes. Ele foi arrolado como testemunha na ação penal do caso.

Além das atividades imobiliárias, Bruno é dono de uma casa de câmbio no centro.

Governador não comenta; advogado fala em ‘confusão’

Procurado, o governador não comentou a relação com o advogado.

Pipo afirmou que a acusação de invasão em terra pública se deve a uma confusão com um homônimo que atua na região. O advogado declarou que era dono do terreno em frente ao do município.

A prefeitura questionou no processo a versão sobre a confusão, indicando que uma comerciante do lote em disputa apresentou contrato de locação com Pipo. Questionado sobre o tema, o advogado disse que não poderia compartilhar estratégias processuais.

Em relação à ligação com Brazão, Pipo disse que prestou uma assessoria jurídica técnica em razão de seu histórico como assessor da presidência do Tribunal Regional Eleitoral.

“Resolvi pedir exoneração do cargo para me dedicar integralmente ao meu escritório, que já demandava mais tempo e dedicação”, disse.

Pipo disse ainda que os imóveis da família na região do Terreirão estão alugados e não sofrem “qualquer tipo de coação ou participação de grupos criminosos, em especial dos chamados ‘milicianos'”.

A Folha enviou emails para Carmindo, mas não obteve retorno. No processo em que foi acusado de ameaçar pessoas envolvidas na disputa de terras, ele negou a coação. Disse que os depoimentos usados na acusação eram falsos, assim como as acusações de fraude nas notas promissórias.

Bruno não retornou aos contatos da reportagem por telefone e email. À polícia ele disse ter obtido diversas certidões antes de celebrar a escritura do imóvel alvo da fraude. Pipo afirmou que o irmão é apenas testemunha no caso.

noticia por : UOL

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