A obra do VLT, prevista para 2014 e paralisada por decreto estadual, custou mais de R$ 1 bilhão e, atualmente, está sendo demolida. Dos 22 quilômetros de trilhos previstos no projeto – e que contavam com ferro da Polônia e borracha da Itália –, seis já estavam prontos, mas estão sendo jogados fora. O prejuízo está calculado em quase R$ 89 milhões, segundo o consórcio que implantaria o modal. De acordo com o consórcio do BRT, em estimativa feita cinco anos atrás, seriam necessários mais R$ 922 milhões para terminar a obra.
Atualmente, o responsável pela obra é o consórcio Construtor BRT – formado pelas empresas Nova Engevix, Heleno e Fonseca Construtécnica, e Cittamobi. A licitação foi realizada em 2021 e a vencedora do certame comprometeu-se a implantar o BRT ao custo de R$ 468 milhões, recomeando os serviços a partir de abril de 2023.
MP-MT e MPF analisam os documentos para eventuais providências, caso sejam confirmados indícios de irregularidades. Veja o que disseram os citados ao final da reportagem.
Dentre os documentos apresentados pelo prefeito da capital no dia 7 de março de 2023, consta um organograma que, segundo Pinheiro, indica uma ligação entre empresários e empresas ganhadoras da nova licitação do corredor de mobilidade com Mauro Mendes, amigos dele e o deputado, que faz parte do mesmo grupo político.
“Segue em anexo ata notarial, demonstrando a vinculação do senhor José Luiz Borges Garcia Filho (primo do atual Deputado Federal Fabio Garcia), com a pessoa jurídica Concremat Engenharia e Tecnologia, pessoa jurídica pertencente ao mesmo Grupo Econômico das empresas integrantes do Consórcio Construtor BRT Cuiabá, vencedor do RDC n° 047/2021 e elo de ligação com as pessoas jurídicas pertencentes ao Governador do Estado e/seus familiares”, afirma o texto protocolado.
“Por derradeiro, segue em anexo ainda, organograma demonstrando a relação do grupo econômico do Governador, seus familiares bem como parentes do Deputado Federal Fabio Garcia, todos eles sendo consorciados em comum, com consórcio vencedor e perdedor do BRT, igualmente com empresa que emitiu o parecer em desfavor do VLT pela mudança de modal”, completa.
Organograma e supostas ligações
No topo do organograma (veja acima), aparece a Engeglobal Construções, empresa em recuperação judicial e que não finalizou obras pelo estado, como o Aeroporto Marechal Rondon, em Cuiabá.
Na segunda linha, está o nome de José Luiz Borges Garcia, já falecido – filho do ex-governador mato-grossense José Garcia Neto. Engenheiro e professor universitário, foi homenageado com o nome de uma das obras de infraestrutura viária do mesmo pacote VLT/BRT, conhecida como Trincheira da Jurumim, na capital.
A linha que sai do nome dele no organograma vai para José Luiz Borges de Garcia Filho, e para o tio dele, Fernando Robério de Borges Garcia, o Berinho, outro herdeiro do ex-governador. Berinho é um dos sócios da Engeglobal.
José Luiz Borges Garcia Filho é primo do deputado Fabio Garcia, que é filho de Robério, e neto do ex-governador falecido.
Já a Concremat tem participação societária de Fernando Robério e é uma das empresas com participação junto da Nova Engevix em outras licitações públicas.
Por sua vez, a Nova Engevix, conforme a documentação apresentada, fazia parte do consórcio Mobilidade MT, junto com a Paulitec Construções e ambas eram parceiras em outro empreendimento.
Oficialmente em lados opostos na licitação em Mato Grosso, Nova Engevix e Paulitec mantêm parcerias em outras disputas e na execução de obras públicas, descreve o dossiê. Entre elas, o monotrilho Jacu-Pêssego, em São Paulo. O projeto teve como vencedor o Consórcio PN Príncipe, formado pelas duas empresas.
Essa relação, de acordo com o apontamento do prefeito de Cuiabá, configura grupo econômico, o que esbarraria nas proibições da nova lei de licitações. Outro detalhe apontado como um indício da necessidade de investigar o processo licitatório é a proposta semelhante apresentada pelos consórcios concorrentes. A vencedora ganhou da derrotada por menos de R$ 20 mil.
Os documentos recebidos pelo MP-MT e MPF apontam ainda uma proximidade política entre Robério Garcia e Mauro Mendes. Berinho participou da coordenação de campanhas disputadas pelo atual governador e, em contrapartida, teve apoio de Mendes na eleição passada, quando foi o deputado mais votado de Mato Grosso.
Mauro era prefeito de Cuiabá quando foi definida a construção do VLZ, nos moldes do Rio de Janeiro (RJ).
O que dizem os citados
MP-MT e MPF informaram que os documentos protocolados por Emanuel Pinheiro ainda estão sob avaliação. O órgão estadual comunicou ainda que foram solicitadas informações ao Tribunal de Contas do Estado.
O Consórcio VLT Cuiabá-Várzea Grande observa com perplexidade a destruição de patrimônio público na Avenida da FEB, algo nunca visto em obras públicas. O desmonte, na ótica do Consórcio, não encontra amparo de ordem técnica ou de economicidade de recursos públicos.
Enquanto o desmonte de estruturas no traçado em Várzea Grande, lamentavelmente, avança, o Consórcio segue empreendendo, por liberalidade das empresas, a guarda de equipamentos e a manutenção dos 40 trens adquiridos pelo governo do Estado, até que importantes questões pendentes sejam decididas pelo Poder Judiciário.
O Consórcio faz questão de registrar que sempre esteve, e ainda está, à disposição do Estado para a construção de uma solução legítima e viável à retomada e conclusão do projeto VLT, que já poderia estar em operação, para uso da população.
Nota enviada pelo deputado federal Fábio Garcia:
A tentativa de envolvimento de minha pessoa na denúncia é uma armação política, feita cinco meses depois da denúncia ser realizada justamente quando ataco frontalmente a gestão Emanuel Pinheiro.
A denúncia não traz nenhuma ação ou atitude feita diretamente pela minha pessoa, mas sim uma tentativa mentirosa e descabida de me envolver com fatos dos quais não tenho nenhuma relação.
Na verdade, tentam me impedir e me intimidar a continuar expondo e denunciando os demandos e corrupção da administração Emanuel Pinheiro.
Seguirei firme e combatendo essa gestão corrupta e incompetente.
Nota enviada pelo governador Mauro Mendes:
O Consórcio VLT praticou corrupção com agentes públicos do Estado. Por isso o contrato foi rescindido e o consórcio perdeu em todas as instâncias do Judiciário.
O Estado cobra na Justiça a devolução de R$ 1,2 bilhão, e por isso o consórcio está tentando de todas as formas e meios retomar o contrato para não ter que devolver essa quantia milionária.
Todas as alegações desta petição são infundadas e não há qualquer ato contrário à legalidade no processo de implantação do BRT
Nota enviada pelo Consórcio Construtor BRT:
A Nova Engevix elucida que não possuí relação societária com a Paulitec Construções e tampouco relações jurídicas com a Concremat Engenharia e a Engemix.
O Grupo conta com uma área de Governança e Integridade, a qual opera um programa de compliance robusto, com processos internos rigorosos, inclusive com certificação em norma internacional anticorrupção e demais legislações vigentes. A Nova Engevix participou de forma absolutamente íntegra na licitação do BRT de Cuiabá.